fevereiro 28, 2005

Canto do Rio

Uma trilha sonora alternativa aos 440 anos do Rio de Janeiro é o CD Lembranças Cariocas, com sucessos imortais de Cartola, Carlos Cachaça, Lupicínio Rodrigues, Ari Barroso, Wilson Batista, Braguinha, Dorival Caymmi, Moreira da Silva e outros que eu provavelmente estou esquecendo. Foi através deste disco que conheci esta poesia de Carlos Drummond de Andrade, declamada por Chico Buarque antes da marchinha Estrela do Mar, de Paulo Soledade e Marino Pinto, encerrar o CD deixando ao ouvinte aquela saudade no ar... Daí é só apertar repeat.

Rio de Drummond
Canto do Rio em Sol

I

Guanabara, seio, braço
de a-mar:
em teu nome, a sigla rara
dos tempos do verbo mar.
Os que te amamos sentimos
e não sabemos cantar:
o que é sombra do Silvestre
sol da Urca
dengue flamingo
mitos da Tijuca de Alencar.
Guanabara, saia clara
estufando em redondel:
que é carne, que é terra e alísio
em teu crisol?
Nunca vi terra tão gente
nem gente tão florival.
Teu frêmito é teu encanto
(sem decreto) capital.
Agora, que te fitamos
nos olhos,
e que neles pressentimos
o ser telúrico, essencial,
agora sim és Estado
de graça, condado real.

II

Rio, nome sussurrante,
Rio que te vais passando
a mar de estórias e sonhos
e em teu constante janeiro
corres pela nossa vida
como sangue, como seiva
- não são imagens exangues
como perfume na fronha
... como pupila do gato
risca o topázio no escuro.
Rio-tato-vista-gosto-risco-vertigem
Rio-antúrio
Rio das quatro lagoas
de quatro túneis irmãos
Rio em ã
Maracanã
Sacopenapã
Rio em ol em amba em umba sobretudo em inho
de amorzinho
benzinho
dá-se um jeitinho
do saxofone de Pixinguinha chamando pela Velha Guarda
como quem do alto do Morro Cara de Cão
chama pelos tamoios errantes em suas pirogas
Rio, milhão de coisas
luminosardentissuavimariposas:
como te explicar à luz da Constituição?

III

Irajá Pavuna Ilha do Gato
- emudeceram as aldeias gentílicas?
A Festa das Canoas dispersou-se?
Junto ao Paço já não se ouve o sino de São José
pastoreando os fiéis da várzea?
Soou o toque do Aragão sobre a cidade?
Não não não não não não não
Rio, mágico, dás uma cabriola,
teu desenho no ar é nítido como os primeiros grafismos,
teu acordar, um feixe de zínias na correnteza esperta do tempo
o tempo que humaniza e jovializa as cidades.
Rio novo a cada menino que nasce
a cada casamento
a cada namorado
que te descobre enquanto rio-rindo.
assistes ao pobre fluir dos homens e de suas glórias pré-fabricadas.

fevereiro 27, 2005

Como eu não pensei nisso antes?

Já foi mencionado num texto deste blog algo sobre a invenção de um refrigeranteTangerina de tangerina. Realmente...por que nunca ninguém inventou um refrigerante de tangerina? Ora, se existe uma fruta que deveria virar sabor de um refrigerante, é a tangerina! Essa lembrança acabou servindo como uma introdução para um relatório que segue nos próximos parágrafos de coisas que já deveriam ter sido inventadas, mas os responsáveis por isso nos seus respectivos setores industriais não pensaram. Isso é inaceitável!
Bem, vamos lá: como assim não existe uma comida - doce ou salgada - azul??? É possível comer alimentos de todas as cores (até cinza, vide mingau de aveia). Menos azul. Não pense, caro leitor, que anis é algo saboroso e apetitoso. Muito menos anelina. Mas qual seria então a tal guloseima azulada ideal? De repente a resposta seja um chocolate! De dentro do clássico papel laminado surgiriam barras da cor daquele mar caribenho das fotos nas paredes de agências de viagens. Para quem quer um sabor mais forte, chocolate azul-marinho.
Seria bom um refrigerante dessa cor também. Afinal de contas, é decepcionante ver sair um líquido marrom de dentro da bela lata azul de uma conhecida marca.
Garrafas triangulares são essenciais. Quem nunca, sem querer, acabou se babando, já que a boca dificilmente dá vazão à quantidade de líquido que sai daquele gargalo redondo? Se muitos não babam, é porque já estão experientes nesse assunto, já que as pobres criancinhas são as principais vítimas do design das garrafas de formas arredondadas. Com as triangulares esse problema estaria resolvido, afinal o líquido sairia direcionado para a boca como uma espécie de mangueira e dificilmente vazaria para as bochechas, queixo, nariz e adjacências.
Custa oferecer mais atrações a quem viaja de avião? Cinema e revistas...coitado de quem vai para Tóquio. Tem horas que o tédio é tamanho que até aqueles vendedores de bala em ônibus quebrariam um galho. Poderia existir uma espécie de salão na parte de trás do avião para eventos mais...digamos... dinâmicos. É claro que isso obrigaria as companhias a construirem banheiros maiores nas aeronaves. Isso seria bom para quem quisesse, por exemplo, tomar um banho depois depois de uma sessão de ginástica nos céus. Sapatos com solas acolchoadas e molas!!! Não seria perfeito andar sempre com a sensação de estar sobre aqueles colchões que todo mundo gosta de pular? Isso acabaria também com as reclamações de dores nos pés por estar caminhando o dia inteiro. Afinal, é como se você estivesse sobre a sua cama. E se por acaso alguém tiver que procurar uma pessoa no meio da multidão, basta pular, afinal as molas dão conta do recado. Seria um impulso (olha o trocadilho!) para a indústria de molas.
Mas não são só os simples mortais que deveriam inovar. Até mesmo Deus e a genética deveriam dar uma forcinha (espero que o Homem não encare isso como um desafio...). Afinal de contas, por que não existem japoneses(as)de olho claro ou com o cabelo sarará???
Os seres humanos também deveriam ter asas. Não seria ótimo poder voar por aí? Tudo bem que acabaria a privacidade dos apartamentos. Mas isso é o de menos, afinal o homem sempre deu grande valor a um par de asas, muito mais do que os pássaros...
Acho melhor parar por aqui. Até porque daqui a pouco vão dizer que estou criando cabelo em casca de ovo, ficando louco, e alguém vai ter a "brilhante" idéia de querer me internar num hospício.

fevereiro 25, 2005

O exílio pelo tempo

Semana passada o filósofo e antropólogo Claude Lévi-StraussLevi-Strauss (que provavelmente jamais vestiu uma calça jeans) deu uma entrevista ao jornal Le Monde (que não deixo de vasculhar toda a manhã no meu café) falando sobre diversos assuntos, entre eles o Brasil. Não foi, porém, os principais temas que me chamaram a atenção, mas sim uma resposta melancólica e fria sobre a sensação de se estar e pensar no mundo aos 96 anos. Ao ser perguntado o que poderia dizer sobre o futuro, respondeu exatamente o seguinte:

Claude Lévi-Strauss - Não me pergunte nada desse tipo. Nós estamos num mundo ao qual eu já não pertenço mais. Aquele que eu conheci, aquele que eu amei, tinha 1,5 bilhão de habitantes. O mundo atual conta 6 bilhões de humanos. Ele não é mais o meu. E aquele de amanhã, que estará povoado por 9 bilhões de homens e de mulheres --mesmo que esta seja uma estimativa máxima de população, conforme nos garantem para nos consolar - me impede arriscar toda e qualquer previsão...

Senti o peso da efemeridade de simplesmente... tudo. Imaginei que este homem viu “o mundo que amou” ir embora ano após ano junto com as mortes dos amigos e amores, as mudanças de valores, as mudanças na música, no cinema, na comida, nas cidades enfim, de tudo o que amamos e compartilhamos, como a genial e insubstituível prática de se sentar numa mesa de bar e beber o primeiro gole do chope gelado (sem antes brindar, é claro, para não afetar anseios fundamentais. Aliás, essa prática vale uma tese. Porque de todas as manias, a de brindar o chope antes de beber é a mais temida por todos? Loucos, poetas, ricos, pobres, feios, bonitos... Por que não importa se você é cético ou místico, o possível castigo de não se brindar o primeiro chope é simplesmente muito penoso).

Voltando ao assunto desviado por uma boa causa. Ao ler essas palavras de um homem que espera pela morte sem poder imaginar nem os próximos cinco anos, me perguntei se esse mundo pertencia a mim ou o que significava ter um mundo que me pertence. Cheguei à conclusão de que Lévi-Strauss não estava falando de um mundo objetivo - que não pertence a ninguém. Eu, por exemplo, não sei chegar em Bento Ribeiro, se o mundo fosse meu eu saberia-, mas sim da sua incapacidade pessoal de se relacionar subjetivamente com as mudanças que atestam a efemeridade de tudo àquilo que pertence a qualquer mundo (seu ou não, amado ou não). O mundo que ele amou não existe mais, isso o torna incapaz de amar outro mundo? Será que eu vou desejar estar neste mundo quando tudo aquilo que eu conheci morrer ou se tornar história?
A partir de hoje tenho novos planos. Vou amar ainda mais esse mundo com muita cerveja, gorduras de todas as naturezas, colesterol, cafeína, carboidratos e também me ausentarei da prática de qualquer exercício físico que beneficie o coração e previna a diabetes (exceto os que envolvem uma bola de futebol e outras coisas com curvas). Porque afinal de contas, eu não quero morrer depois do meu mundo. Prefiro ser a história dele do que historiador.
texto desengavetado por João Rabello

fevereiro 24, 2005

Idéias subversivas como a de um novo refrigerante com sabor de tangerina

Hoje foi um daqueles dias em que acordei e percebi que não havia sonhado com nada. “E daí?”, você deve estar pensando; “Eu também quase nunca sonho...” brasiliaMas não é desse não-sonhar que estou falando. Explico: na maioria das vezes eu também não me recordo dos meus sonhos, mas sei que tive uma noite repleta deles. A sensação que tento descrever é diferente e meio paradoxal, mesmo – tanto que me fez começar esse texto com “hoje foi”, o que por si só já é contraditório o suficiente.
Acordei, abri os olhos de supetão e olhei para o branco do teto do meu quarto. E assim também estava minha cabeça, completamente vazia. Demorou ainda um pouco para pipocar aqueles pensamentos que uma cabeça vazia costuma ter. Porque quando não se sonha, quando acordamos com a cabeça tabula rasa, os pensamentos que brotam ao longo do dia são sempre muito intensos e perigosos. É como se Morfeu, para compensar o fato da ausência de sonhos na noite anterior, nos enfiasse pelos ouvidos pedaços de sonho em intervalos durante todo o dia. São os que os leigos chamam de insights e muito costumam ficar bem contentes quando os têm. O mundo hoje, o tempo todo, cultua boas idéias. E eu não entendo direito o por quê, se tanta idéia ruim dá certo.
Acho assustador a idéia de pessoas tendo boas idéias assim por aí. Onde o mundo vai parar? Tornar-se-á platoniano, talvez? Não quero fazer falso alarde. Nem deixar você, leitor, preocupado. Sim, meu caro, você pode ter uma boa idéia a qualquer momento. Mas não se preocupe! A maioria, ufa!, simplesmente deixa essas idéias subversivas prá lá. Num canto escuro de uma cabeça vazia.

fevereiro 22, 2005

A vida é uma caixa de surpresas...e de remédio

Agora um pouco de reflexão. Mas nada de coisas efêmeras e transcedentais para explicar a vida, por favor! Não tenho paciência para essas coisas. Fique tranqüilo(a), já que pelo menos tentarei ser mais prático do que muitos filósofos e pensadores (sem generalizar).
Às vezes a vida da gente parece uma mesmície, um marasmo só, não é mesmo? Vivendo dia após dia, não percebemos as mudanças que ocorrem à nossa volta a todo o momento, numa velocidade e intensidade impressionante. Só ao parar e pensar no passado, tanto recente quanto distante, nos damos conta de que muita coisa mudou. É difícil ter a real percepção de como tudo que compõe a nossa vida (os sentimentos, o corpo, as atividades, os hábitos, os pontos de vista) muda a todo instante. A não ser que se tenha um medidor para isso.
Eu acabei descobrindo o meu medidor: uma caixa de remédio homeopático receitada pela minha médica, mais precisamente os 60 papelotes que eu tive que tomar diariamente nos últimos dois meses. Não está entendendo? Leia os próximos parágrafos e acredito que as coisas ficarão mais claras.
Era início de dezembro quando tomei o primeiro papelote da caixa. A minha vida estava aparentemente normal. Nada havia me marcado nos últimos tempos para dizer que a minha rotina estava diferente, ao menos que eu tenha percebido. Conforme os dias se passavam eu tomava os remédios e a minha vida (como sempre) mudava. Era fim de ano, o verão chegava, várias festas para se ir (só onde trabalho, foram duas senhoras festas), especial do Roberto Carlos, natal, presentes, ano novo, comemorações... ok, depois de um reveillon, a sensação de que as coisas mudaram é comum a todos. Pulemos, portanto, essa parte.
Chegou um novo ano. E lá estava eu tomando meu remédio de todo dia. Pouco tempo havia se passado do turbilhão de acontecimentos do fim do ano e a vida continuou mudando. Lá se foi minha irmã para a Europa...do nada me tornei filho único, o, digamos, rei da casa. Legal!
Pouco tempo depois, num dia em que naturalmente tomei mais um papelote do remédio, minha mãe também se mandou para o "velho continente". A partir dali, estava sozinho em casa com o meu pai. Àquelas alturas, faltava pouco tempo para o carnaval. Mal podia esperar. Mas esperava...tomando meu remédio todo dia, é lógico.
E lá se iam os papelotes, cada um impresso com o número da dose e, ao mesmo tempo, o de dias que eu já havia tomado o remédio. Chegou o fim de semana anterior ao do carnaval e era hora de esquentar os tamborins, não sem antes esquecer de tomar a dose diária. Festas, blocos, jogo no Maracanã...eu estava num rítmo olímpico!!!
Mas acabou o fim de semana, chegou a segunda-feira e, nesse único dia, eu não tomei o remédio. Depois de toda a farra eu ainda fui trabalhar (trabalho de madrugada), mas não pude ficar exausto ao chegar em casa: meu pai teve um acidente vascular cerebral e minha vida saiu de uma suposta rotina para entrar num novo turbilhão (como se já não estivesse dentro dele). Tive que assumir responsabilidades, conviver com a maior preocupação que já tive, acalmar a minha irmã e a minha mãe viajantes (lembre-se que eu estava sozinho aqui), trabalhar, visitar meu pai na C.T.I., traduzir boletins médicos e, acima de tudo, manter a calma e a cabeça no lugar. Acho que consegui, tanto que dois dias depois, na quarta, voltei a tomar o meu remédio.
Passada uma semana disso tudo (preciso dizer que não houve carnaval no meu calendário?), ao pegar mais um papelote para tomar o remédio, reparei como as coisas mudaram desde que tomei a dose número 1. Parecia que a havia tomado num dia muuuuito distante...
Hoje, terça-feira, 22 de fevereiro de 2005, vou tomar a dose número 58, vivendo uma vida bem diferente daquela do dia em que fui à farmácia com a receita para encomendar o remédio. Quantos acontecimentos...
Mas, como diz o ditado popular, nada como um dia após o outro. Afinal, essa é a graça da vida. Portanto, se prepare: a sua vida pode mudar a qualquer momento. Até mesmo...AGORA!

P.S.: a quem interessar possa, meu pai está bem melhor do que quando chegou ao hospital, já saiu da C.T.I. e está no quarto convalescendo.

fevereiro 19, 2005

Juarez Machado: surrealista

Fuçando o site ReleiturasJuarez - Comunhão, esbarrei com os sonetos de Geir Campos. Mas eles não me disseram nada – ou bem pouco. A culpa, acredito, não é de Geir. Faz tempo que nem Vinícius me toca mais. E alguém já falou "é fácil gostar de Vinícius, difícil é gostar de Camões". O que me chamou a atenção mesmo foram as surrealices de Juarez Machado que ilustram os poemas. "Comunhão" e "Tempo Lavado e Passado" tem uma atmosfera que me faz lembrar em muito meu querido Magritte (1898-1967). Juarez - Tempo Lavado e PassadoAs cores do céu, do quarto e a própria temática podem ser facilmente identificada como magritteana – se é que um absurdo de palavra como essa possa existir. Mas, pensando bem, esses dois artistas tem como principal afinidade o maior absurdo de todos: o inconsciente, território nebuloso e onírico onde o homem tão certo de si, tão seguro, não está mais no controle de suas razões.
Juarez, pintor, escultor e cartunista catarinense, vive desde 1978 em Paris, onde deve gozar a vida como um típico artista, de café em café, discutindo política e articulando pequenas revoluções estéticas. Magritte - Em homenagem a Mack Sennett, 1937Ou, então, o clima parisiense faz bem à sua rinite - e só. Juarez ficou mais conhecido nacionalmente ao estrelar um quadro (curiosa ironia) de mímica no Fantástico, da TV Globo, onde também trabalhou como cenógrafo e figurinista. Entretanto, internacionalmente, Juarez é conhecido – e reconhecido – como o bem sucedido pintor de séries como Le Libertin e Copacabana, que transbordam sensualidade e apuro técnico.
Categorizá-lo como artista do nosense é esquecer-se das incursões pelo impressionismo que frequentemente realiza. Algumas de suas obras podem ser saboreadas (acho que elas tem gosto de calda de chocolate com uma pitada de licor de pêssego) através do site oficial http://www.jmachado.com/en/. Experimente!Magritte - O Falso Espelho, 1935
Nas pinturas recentes, Juarez parece ter se afastado do seu lado nosense, mas um olhar absurdo do mundo não se perde assim de uma hora para outra. Basta olhar de perto, com atenção. De algum modo, alguma coisa ali, o clima rodopiante, os olhares, a música, alguma coisa ali não faz sentido. E, sim, isso é delicioso.


Mini-Galeria

Juarez - Le Libertin

Afinidades com René MagritteJuarez - Humor lúdico

Juarez - Figurino para Roberto Carlos Especial, 1975

Copacabana - Les Amis Sur la Plage



ValadãoEm tempo, já que falamos de surrealices, uma foto para lembrarmos de Jece Valadão, ex-cafajeste que tornou-se pastor evangélico desde 1995. Nosso homem do cinema estrelou filmes como Rio 40 Graus e Rio Zona Norte, de Nélson Pereira dos Santos, o emblemático Os Cafajestes , de Ruy Guerra, e o profético Idade da Terra, de Gláuber Rocha. Seu filme mais recente é um documentário dirigido por Joel Pizzini, O Evangelho Segundo Jece Valadão, que de programa de tevê pelo Canal Brasil pode chegar às telonas.
Qualquer novidade eu aviso, pode deixar.

fevereiro 18, 2005

BYE BYE ( Diretores do) BRASIL !!!

Temo em dizer que me choquei ao ler a última declaração de Bruno Barreto, pois vivem falando que a classe cinematográfica é facilmente afetada. A bomba explodiu no jornal O Globo do dia 16 de fevereiro. Barreto Filho dizia que existem muitos diretores de cinema no Brasil. Metade da espécie deveria fazer outra coisa, como dirigir táxi, trabalhar como dentista, virar comerciante.
Até agora não sei a quem Bruno Barreto quis afetar. Confesso que adoraria pegar um táxi para a faculdade conversando com Cacá Diegues, mas também odiaria extrair um dente com Nelson Pereira dos Santos.
O que será que ele quer dizer com isto ?! Que há muitos diretores e poucos projetos realizados ?! Se for, Barretão Pai não ensinou direito ao Barretinho Filho. O problema é a escassez de recursos e incentivos públicos e/ou privados para a realização cinematográfica e não a “quantidade” de diretores de cinema. E como se a quantidade fosse o problema, e não a qualidade. O que há de errado se o mercado cinematográfico está cada vez mais borbulhando?
Acredito que Barretinho se expressou mal. Ele deve ter dito algo relacionado aqueles que não estudam e já se consideram prontos para dirigir um filme ; aqueles “ atores-modelos-apresentadores” que do nada realizam um longa, ou até mesmo daqueles que já herdam um sobrenome de film maker, vão para o exterior e se casam com atrizes americanas.
Vamos esperar. Barretinho vai explicar melhor sua teoria demográfica. Enquanto isso, a gente manda Nelson Pereira dos Santos plantar Mandacaru Vermelho, Walter Salles criar uma cooperativa de motocicletas na Central do Brasil, Fernando Meirelles virar comerciante na Cidade de Deus, Jorge Furtado se formar em odontologia na Ilha das Flores, e ..enfim, quer saber ?!
Bruno Barreto !! Vá tocar sua Bossa Nova no Casamento de Romeo e Julieta !!

fevereiro 17, 2005

Tsunami? Reclame com Moisés

Muito já se sabe sobre os fenômenos geológicos que provocaram os grandes terremotos e maremotos no sul da Ásia. Mas sem querer tripudiar com o ocorrido e pegando carona na onda das tsunamis (sem trocadilho, por favor!) é possível encontrar outros fatores físicos e até mesmo religiosos para explicar o ocorrido. Essas novas explicações serão melhor digeridas por aqueles que acreditam nas palavras da bíblia sagrada. Embora eu não seja uma pessoa religiosa, é interessante observar o assunto do desastre sob um outro ponto de vista.tsunami01
Diz a terceira lei de Newton: a toda ação corresponde uma reação com a mesma intensidade, mesma direção e sentidos contrários. Deixando isso claro, vamos ao livro Êxodos, da bíblia, no trecho em que se relata a passagem dos seguidores de Moisés pelo Mar Vermelho, quando com uma só cajadada o profeta abriu um caminho pelas águas. Para os crentes, que não são poucos, este fato teria realmente ocorrido. Sendo assim, o fenômeno geológico que se abateu sobre e sob a Ásia nada mais seria (veja bem: SERIA) do que uma reação a tal relato bíblico.
michelangelo O mais interessante disso tudo é perceber que essa é uma das poucas vezes em que passagens da bíblia e fenômenos físicos se encaixam de uma maneira tão coerente. Uma coisa leva à explicação da outra. Seriam novos tempos no reino dos céus? Estaria Deus incomodado com as críticas que recebe dos ateus por seus milagres nunca terem uma explicação cientificamente correta?
É uma pena que o livro sagrado, diferentemente de outras publicações como os dicionários e o livro dos récordes, não seja atualizado periodicamente. Caso fosse, daqui a algumas gerações os fiéis leriam que 2004 anos e um dia depois de ter mandado seu filho à Terra, o Todo Poderoso resolveu abater toda a sua fúria sobre a morada dos pecadores para enfim dar um argumento lógico a um dos relatos mais importantes publicado na sua, digamos, biografia.
Assim na Terra como no céu...

fevereiro 16, 2005

Cinema Novo - Aquele que nunca envelhece

Cinema Novo : O Espelho Social

“O movimento tinha um objetivo econômico-político-cultural integrado. Esse projeto gera uma ideologia política através do produto que é feito, pois queríamos fazer filmes que tivessem como objetivo a realidade brasileira, dentro de uma perspectiva revolucionária (...)”
As palavras são de Glauber Rocha e sintetizam a idéia de que o Cinema Novo foi uma arte que teve, por um lado, a preocupação com a transformação e por outro, a garantia da liberdade entre as alternativas que essa arte poderia ter como meio de expressão.Arte essa de agitação e denúncia social que desempenhou um papel de reformulação cultural.
cinemanovo01É o cinema que mostra na ficção a nossa realidade, funcionando como uma bandeira ideológica, que apresenta um fundo revolucionário. Já que esse tipo de filme é autoral e muitas vezes subjetivo, apresenta contribuições pessoais e psicológicas de cada cineasta que o realiza, podendo, assim, influenciar a platéia com seus ideais particulares. Portanto, são formadores de opinião com a tentativa de ser também um instrumento de conscientização.
Glauber Rocha afirmava que o cinema novo não tinha muitos pontos em comum com o cinema mundial, de cunho industrial e compromissado com a mentira e a exploração. O movimento brasileiro nasceu e desenvolvia-se na “política da fome”, e dela era indissociável.
Conseqüentemente, toda a estética do Cinema Novo foi criada e existia em função do compromisso com a realidade e com conscientização do povo a respeito de suas precariedades.
O Cinema Novo teve como alicerce o cinema independente ou cinema de autor, livre do modelo e do dinheiro impostos por Hollywood e marcado pela inspiração e pelo estilo do autor. Glauber Rocha, que fez da questão um ponto freqüente de questionamentos durante e mesmo depois do movimento, afirmava que o cinema de autor é a recusa da indústria, estúdio e linguagem convencional que afastavam o cinema da realidade, em visão muito próxima do neo-realismo.
O Cinema Novo foi uma necessidade de seus autores de expressar e investigar a realidade brasileira, como um efeito de catarse. Sem dúvida, foi importante por ser inovador e independente das algemas industriais, sendo assim, um cinema propriamente de autor. Cria-se então, uma proposta nova e original nas produções cinematográficas compromissada com a vida, com o real , desenvolvendo deste modo, uma descolonização da linguagem dos filmes e explorando os problemas sócio- econômicos do país nas telas.
Este novo tipo de cinema, um autêntico cinema brasileiro falava em nome do povo, ao contrário das chanchadas que falavam a língua do povo. Daí entende-se o porquê do sucesso das chanchadas e o não entendimento popular das obras do Cinema Novo.Contradição que se esconde atrás de suas propostas iniciais. Pelo desejo de se aproximar muito do povo, passa de um movimento popular para uma manifestação burguesa, pois acabou se tornando uma arte de difícil comunicação, limitando assim, o acesso popular.
Pelo estudo da história do Cinema Brasileiro, nos deparamos com obras que em sua maioria, demonstram interesse pelo cotidiano, miséria e pobreza. O Cinema é um espelho da realidade, então, para que haja mudança na arte é necessário uma reforma nacional social, econômica, política e cultural. Mudança essa que para os cinemanovistas deveria ser feita através da imagem revolucionária.
Posso concluir este ensaio com as palavras de Glauber Rocha que traz à vida essa incessante busca através desse espelho chamado cinema: “Arte revolucionária deve ser uma mágica capaz de enfeitiçar o Homem a tal ponto que ele não suporte mais viver nesta realidade absurda.”

Para saber mais sobre o Cinema Novo e simpatizantes:
- BERNARDET, Jean-Claude.” Cinema Brasileiro: propostas para uma história”. Rio de Janeiro. Paz e Terra.1979
- BERNARDET, Jean-Claude.”Brasil em tempo de Cinema”.3 ed. Paz e Terra.1978
- BERNARDET, Jean-Claude. “O que é Cinema”. São Paulo: Brasiliense,2000
- XAVIER, Ismail. “O Cinema Brasileiro Moderno”. São Paulo: Paz e Terra, 2001
- CAVALCANTI, Alberto: Filme e realidade. Rio de Janeiro, Artenova,1976
- RAMOS,José Mario Ortiz: Cinema, Estado e lutas culturais: anos 50,60,70. Rio de Janeiro, Paz e Terra,1983