Decepção
Alguns devem saber que eu nutro uma afeição (ok, paixão desvairada!) por teatro. Pois bem, isso começou quando eu devia ter em torno dos quinze anos. Foi quando fiz uma inesquecível viagem pra Nova York. Lá assisti a vários musicais, mas só um deles (o mais desconhecido por sinal) me marcou. Aida, uma história linda! Que para não causar expectativa àqueles que quiserem ver, não irei contar. Pois foi com ela (a expectativa!), que passei durante esses cinco anos sonhando que pudesse assistir qualquer outra montagem de Aida. E inacreditavelmente consegui.
Estava na Hungria, mais precisamente em Budapeste (onde há a maior concentração de antipáticos do mundo), quando, em meio a uma névoa formada pelos sete graus negativos, eu avisto um cartaz. Lá pairava Aida. Arrastei então minha adorável e compreensível irmã para o teatro. Antes disso, porém, cultivei nela a maior expectativa que um ser humano pode ter e, é claro, a fiz gastar sofridos euros para conseguir o melhor lugar.
Pronto! E estávamos nós coladas no palco. Para ver o espetáculo tínhamos que dar aquela leve deslizada na cadeira. As luzes se apagaram e não posso negar que meu coração deu uma acelerada.
Quando a cortina abre alguma coisa parece estar errado. Não foi preciso deslizar um centímetro sequer para perceber que o cenário tinha detalhes quebrados do adorável isopor que o compunha. Eis que surge no palco, aquilo que os húngaros denominam de ator, que na minha concepção não passava de um péssimo cantor de opera com expressões que nem mesmo beiravam a canastrice. Depois de ter absorvido isso, eu cheguei a brilhante conclusão de que ele era o mocinho da peça. Eu gostaria de dar uma prévia de como ele era fisicamente, mas não vou causar esse trauma em vocês. Acho que podem imaginar como era o resto do elenco. A protagonista até chegava à categoria de canastrão. E isso tudo em italiano... E com legenda em húngaro!
Vocês podem imaginar até onde eu escorreguei na cadeira, na hora do intervalo, para não precisar olhar a minha irmã. Quando ainda estava no breu, eu estava no meio da minha oração, quando comecei a acreditar que por sorte eu tinha desaparecido, a luz acendeu e minha irmã já estava com todas as palavras da bronca decoradas (pelo menos ela teve uma distração durante a peça).
Com uma paciência, que não lhe é característica, sugeriu que nos retirássemos do teatro. Nesse momento eu cometi mais um erro, talvez o pior: tive esperança que pudesse mudar. Ficamos. E depois dessa experiência fui escrava das vontades da minha irmã pro resto da viagem (quiçá da vida!) e com razão.
Mas calma! Se você ignorar o mal-humor, a ignorância, a impossibilidade de comunicação, o frio de matar e os péssimos atores; Budapeste é linda.
Texto desengavetado por Flavia B.