Estórias de uma Ponte Aérea
Todos sabem que eu gosto de viajar. Não que todos me conheçam pra saber isso, mas é que na verdade, todo mundo gosta de viajar. Mas uma coisa que talvez poucos saibam é que eu morro de medo de avião. Desde que eu peguei uma turbulência (leia-se “ terremoto, maremoto, tsunami”) em uma viagem para Las Vegas, eu nunca mais consegui entrar num avião tranqüila.
Depois de meses em tratamento psiquiátrico, entrei em uma Ponte Aérea para São Paulo.
Me sentia bem, feliz e realizada. Afinal, estava sozinha dentro daquela ave mecânica. Sentei no corredor ( é mais fácil de correr caso aconteça alguma coisa) e na penúltima cadeira, onde fica a tal caixa preta, e que segundo o documentário do Discovery Channel é o local mais seguro do avião. Li três vezes o cartão de segurança, estiquei a cabeça para ver as instruções da aeromoça e o avião decolou.
Ao meu lado, estava sentado um casal. Tudo corria bem. Eu até tentava ler Drummond, mas a conversa paralela não me deixava concentrada. Eu também não sei o porquê de ter levado Drummond para ler em 35 minutos de viagem. Mas enfim,escolhas a parte, a comissária de bordo avisou que logo serviriam o “delicioso Founde Express da Varig”. Mas enquanto não chegava .... o casal continuava a conversar. O homem sentado á janela lia O Globo com as fotos dos atentados ao metrô de Londres e sua mulher palpitava sobre terroristas. Até que a infeliz lembrou do dia 11 de setembro. É ...aquele dia dos aviões seqüestrados, aquele dia que os aviões bateram nas torres...aquele dia de aviões em pedacinhos ..aquele dia terrível, que pode e deve ser lembrado , mas NUNCA dentro de um avião ! Eu suava frio ...e ela relembrava cada detalhe, e ainda tinha um discurso de que ficou muito feliz com “o declínio do império americano”. Certamente uma frase que ela decorou da coluna do Arnaldo Jabor.
Minha mão não virava mais uma página, meu olho não lia mais uma palavra, e meu remédio de pânico estava na mala . E me dava mais pânico levantar para pegá-lo, pois era preciso tirar o cinto de segurança. Até que “o delicioso Founde Express da Varig “ me salvou e a criatura se calou.
Eram dois potinhos : um cheio de frutas, outro com uma calda de chocolate quente. A anti-americana terrorista primeiro come todas as frutas sem nada, e depois bebe o caldo de chocolate puro. Ainda não satisfeita, bebe o caldo desprezado pelo marido também. ( Ainda bem que era uma ponte aérea, se a viagem fosse longa, nem quero imaginar quantos saquinhos daqueles iríamos precisar). A senhora então olha para o lado e me vê molhando o morango na calda de chocolate e exclama:
- Ih Adolfo, olha ! Era para comer assim que nem ela ...
O E.T então voltou a falar mal da terra do Tio Bush. Ainda no primeiro parágrafo de Drummond, eu não agüentei mais , virei pro lado e perguntei:
- Por quê a senhora está bebendo Coca-Cola então ?
Adolfo mandou seu E.T ficar calado, disse para não ligar para o que eu falei. O avião chegou em São Paulo e eu acho que não volto ao psiquiatra tão cedo.